Antes do sorteio dos grupos da Libertadores, Rodolfo Landim e Marcos Braz estavam na expectativa de que o Flamengo não enfrentasse times de cidades situadas em locais elevados acima do nível do mar. No entanto acabaram sendo “presenteados” com dois desses adversários. Contra o Bolívar, em La Paz, os rubro-negros terão o desafio de encarar os 3.600 metros de altitude. Já em Bogotá, casa do Millonarios, a altitude é um pouco menos extrema, ficando em torno de 2.600 metros.
A diferença de 1.000 metros entre as capitais da Bolívia e da Colômbia é significativa e tem um impacto crucial na preparação para ambos os jogos. Para abordar como isso afeta a performance, Fábio Mahseredjian, responsável pela preparação física do Flamengo, deu uma entrevista para esclarecer.
A experiência mais recente de Mahseredjian em lidar com altitude em partidas de futebol foi justamente em La Paz, onde Bolívar enfrentará o Flamengo programado para o dia 24 de abril, logo após jogos importantes com o Palmeiras e com o Botafogo.
Ao lado de Tite e dos demais membros da comissão técnica, o preparador esteve presente em 29 de março de 2022 no confronto contra a Bolívia, na fase final das eliminatórias para a Copa do Mundo do Catar. A estratégia tradicional de chegar à cidade no dia do jogo deu resultados excelentes, levando o Brasil a conquistar a maior vitória da história em confrontos realizados em La Paz: 4 a 0.
A logística para os jogos no Estádio Hernando Siles, lar do Bolívar, é organizada da seguinte maneira: a equipe chega a Santa Cruz de la Sierra, situada ao nível do mar, no dia anterior ao jogo e lá passa a noite. A viagem para La Paz acontece pouco antes do horário da partida, cerca de três horas antes, e o time permanece no local por no máximo seis horas, e o porque disso Mahseredjian explica:
“Não tem segredo, cara. Existem o que chamamos de “altas altitudes”, que são altitudes acima de 3 mil. Nessas altitudes, não é que o ar seja rarefeito. É que quanto mais você sobe, menor é a densidade do ar. E, como a densidade do ar é menor, você diminui a PO2 alveolar, a pressão parcial de oxigênio no teu alvéolo. E que diminui assim a captação de oxigênio”.
“Então, a altitude afeta o teu sistema de transporte de oxigênio, mas o mais importante são os efeitos agudos dessa exposição à altitude quando você sai do avião e você põe o pé para fora, a 3.600 metros, que é a altitude de La Paz. E no aeroporto é de até 4.000m. Você na hora começa a hiperventilar. O que é hiperventilar? Você fica ofegante sem perceber. Eu, que sou da área, percebo que estou ofegante. E todos os jogadores ficam ofegantes também. Isso desencadeia uma série de reações fisiológicas no teu organismo que demoram a aparecer”.
O preparador esclarece que a única forma de se adaptar e reduzir os problemas provocados pela altitude de 3.600m de La Paz seria chegando ao local 15 dias antes do jogo. Contudo, esse movimento, obviamente, é inviável. Então que justifica a chegada horas antes da partida, indo totalmente contra as opções de permanecer por duas semanas na região? O tempo de manifestação dos sintomas.
“Os sintomas a essas reações demoram aproximadamente seis horas a aparecer. Quais são esses sintomas? Dor de cabeça muito forte, náusea, ânsia de vômito, sangramento nasal. Você opta por chegar na hora do jogo somente por esse aspecto de sintomas que você tem da exposição aguda à altitude. Por quê? Fisicamente, você vai perder de qualquer forma. Você vai ter um decréscimo na potência e na capacidade aeróbica. Porque o seu sistema de transporte de oxigênio está afetado”.
A urgência de retornar para casa quase que imediatamente também ocorre em consideração às seis horas em que os sintomas começam a se manifestar. Em 2013, Fábio Mahseredjian e a equipe do Corinthians tiveram dificuldades para retornar imediatamente após o empate por 1 a 1. A falta de iluminação no aeroporto foi o motivo que os levou a permanecer em Oruro, onde a altitude chega a quase 4.000 metros acima do nível do mar.
“Eu lembro quando eu fui a Oruro em que nós fomos obrigados a dormir lá porque o aeroporto não tinha iluminação. Então nós tivemos que dormir lá, nós fomos obrigados a dormir lá. (O Corinthians sofreu?) Muito, é 4.000 mil, né? São 3.980 metros, acho. Sofreu bastante. Nós chegamos umas quatro horas antes do jogo e tivemos que pernoitar lá depois do jogo porque o aeroporto não tem iluminação. No dia seguinte, o doutor Guilherme Runco falou: “Fábio, foi a pior noite de trabalho da minha vida. Eu nunca trabalhei tanto. Jogador ligando o tempo todo falando: Eu estou mal, estou com um enjoo, estou nauseado, sangrou meu nariz, dor de cabeça, poxa, faz alguma coisa…. Então sofre-se muito”.
Fábio explicou que a reação dos jogadores é bastante individual. Paolo Guerrero, ex-jogador do Flamengo, ficou muito cansado. Por outro lado, o ex-meia Danilo, atual técnico do sub-20 do Corinthians, lidou bem com a situação.
“Agora as reações também são individuais. Tem atletas que sofrem mais, outros sofrem menos. Eu lembro que o Danilo não sentiu nada. Absolutamente nada. O Paolo Guerrero não estava aguentando mais. Ele teve que ser substituído. Esses sintomas em decorrência de você estar exposto à altitude de pessoa a pessoa”.
A diferença de 1.000 metros de altitude, como mencionado no início, tem um grande impacto. Enquanto La Paz é desafiadora, Bogotá (2.600m) é mais amena para os atletas. Devido às reações menos intensas dos jogadores, os clubes geralmente planejam pelo menos um treinamento na capital da Colômbia para se adaptarem à velocidade da bola.
O Flamengo enfrentará o Millonarios no dia 2, entre as duas finais do Campeonato Carioca. A expectativa é de que a equipe viaje no domingo e treine na segunda-feira, véspera da partida.
Participe do canal no Whatsapp do CraqueFC e fique por dentro de todas as notícias e novidades! Clique aqui.
